Transação tributária não é apenas mais um parcelamento: o precedente do STJ e a maturidade do modelo negocial no Direito Tributário (Dr. Marco Antônio Ruzene – Ruzene Sociedade de Advogados).

A recente decisão da 1ª Turma do STJ, que afastou a aplicação do artigo 90 do Código de Processo Civil em casos de desistência de ações judiciais para fins de transação tributária, marca mais do que um entendimento processual. É um passo relevante para consolidar a transação como um modelo legítimo e estruturado de solução de litígios fiscais e não como mero prolongamento dos antigos parcelamentos especiais.

Nos anos 2000 e 2010, passamos por uma sucessão de programas de parcelamento que, embora eficientes em momentos de crise, perpetuaram a lógica de postergação e confissão ampla. A Lei 13.988/2020 rompe com esse ciclo ao introduzir um instrumento voltado à consensualidade e à racionalização da cobrança.

A decisão do STJ, nesse sentido, corrige uma distorção interpretativa que ameaçava descaracterizar a natureza da transação tributária. Ao reconhecer que a imposição automática de honorários sucumbenciais conflita com a lógica de autocomposição, o Tribunal reafirma os fundamentos de boa-fé, proporcionalidade e segurança jurídica que regem o instituto.

A crítica central está no risco de confundir a transação com um mero parcelamento acrescido de benefícios fiscais. O que a diferencia é justamente a individualização dos critérios, a dosagem de concessões mútuas e a finalidade de encerrar o conflito, seja pela inadimplência com perda de capacidade contributiva, seja pela controvérsia jurídica em tese tributária relevante.

Conforme explica o artigo 171 do CTN, a transação é, por natureza, meio alternativo à jurisdição. Seu propósito é a resolução consensual do litígio, e não a simples reconfiguração de prazos ou abatimentos. Os descontos concedidos não são remissões generalizadas, mas reflexos proporcionais do risco assumido ou da viabilidade de recuperação do crédito tributário. O contribuinte, por sua vez, abdica de teses, defesas e pretensões, o que exige segurança sobre os ônus que essa escolha pode acarretar.

A exigência de honorários em caso de desistência da ação, sem previsão legal expressa, compromete essa equação. Como introduzido em recente entrevista à ConJur, embora a discussão seja juridicamente relevante, não se pode permitir que haja complicações no propósito maior da transação: promover regularização fiscal de forma estruturada e cooperativa.

O STJ sinaliza uma compreensão mais madura do papel da transação na política tributária contemporânea: um mecanismo de encerramento de litígios pautado em análise individualizada, segurança jurídica e previsibilidade, e não uma repetição disfarçada dos instrumentos do passado.

A transação não é um benefício. É uma alternativa institucional. E precisa continuar sendo tratada como tal.

Fonte – Dr. Marco Antônio Ruzene – Ruzene Sociedade de Advogados